Vinum vita est

Taverna romana em Pompéia


No auge do Império Romano, na época de Augusto (Gaius Iulius Caesar Octavianus Augustus, 63 a.C – 14 d.C) avaliava-se em um milhão o número de habitantes de Roma – capital do mundo e protótipo das metrópoles modernas. Os seus moradores enfrentavam problemas semelhantes ao que enfrentamos nas urbes hodiernas. O abastecimento de água e outros serviços públicos funcionavam satisfatoriamente, porém, o trânsito era caótico. O próprio Augusto teve que tomar uma medida drástica, proibiu a circulação de carroças que abasteciam o mercado durante o dia. Vamos lembrar que nesse tempo, a iluminação noturna era feita na base de tochas e que os ladrões e mulheres de vida fácil preferiam o período noturno para o exercício de suas vetustas profissões.
O bom romano geralmente não comia em casa. Depois de ir ao fórum para colocar a fofoca em dia e ser vítima de encontrões e esbarros nas vias, ele se alimentava em sítios parecidos com os botequins de nossas ruas. O fast food latino, a taverna, servia bons pratos de frutos do mar e grãos – é meu amigo, o Mc Donald’s não é ideia nova, com a vantagem de dieta mais saudável, nada de comida com gosto de isopor!
Afora a boa alimentação, nas tavernas servia-se o vinho, a bebida socializante que reunia ao seu redor o senhor e o plebeu, os oficiais pretorianos e seus soldados, magistrados e legisladores, governantes e conspiradores. O vinho era considerado pelo romano magnífico remédio para espíritos deprimidos e uma forma de se posicionar dentro de uma sociedade estratificada – cidadão, plebeus e escravos. “Vinum vita est”, dizia o novo rico Trimalquião ao apresentar seus melhores vinhos numa festa descrita por Petrônio no romance Satyricon.  
Hoje, renovaram-se os dedos, mas os anéis são os mesmos. Depois de dois mil anos, o mundo mudou um pouquinho, mas não está tão civilizado como pretendemos e pensamos. Nosso planeta conta com sete bilhões de almas – com boa parte delas vivendo em megacentros urbanos e passando o sufoco de suas misérias. As sociedades ainda amarguram estratificações, a mais das vezes disfarçadas nos figurinos baratos dos plebeus e escravos pós-modernos. O trânsito é caótico em São Paulo, Nova Iorque, ou Nova Délhi, e por lá também circulam prostitutas e ladrões emprenhados em seus ofícios.
Em espírito nada mudou, piorou até, e isso devido à escala: se tínhamos a vaidade de um Trimalquião querendo afirmar o seu novo status quo numa grande festa, hoje temos vários novos ricos lançando mão da mesma estratégia. Caso você more em uma grande cidade, abra o jornal e verifique nas páginas dedicadas aos socialites quantos novos ricos existem por aí servindo rios de vinhos em festas cafonas para provar a nova condição social. Nada contra, é de graça e afinal vanitas vanitatum omnia vanitas. Mas que pelo menos sirvam vinho de boa qualidade, como os novos ricos romanos, pois nele está a vida e in vino veritas!   
(J.F. Nandé – 22/11/2011).

Expressões latinas neste texto:

Vinum vita est : O vinho é vida.
In vino veritas: No vinho está a verdade (Alceu, poeta grego, 630 – 580 a.C.).
Status quo: O estado em que... (como era utilizado em latim, no sentido de coisa anterior). Hoje utilizamos essa locução para posição (social, status) ou conjunto de direitos e deveres.
Vanitas vanitatum et omnia vanitas: Vaidade das vaidades e tudo é vaidade. Palavras do livro bíblico do Eclesiastes, “Vanitas vanitatum, dixit Ecclesiastes, vanitas vanitatum et omnia vanitas”. Aqui, vaidade pode ser traduzida por futilidade ou fugacidade das coisas terrenas.

Um comentário:

Ana Coeli Ribeiro disse...

"Vinum vita est" Vida mesmo é vim aqui ler tuas verdades e anda por cima aprender um pouco de latim. Pulcher.
Luz!
Ana